terça-feira, 18 de novembro de 2008

Arte Contemporânea e Performance


Há muito travo uma luta interessante e incessante para que as pessoas, principalmente meus alunos de teoria da literatura, comecem a entender que ao mundo contemporâneo não é muito bem-vindo aquele conceito aristotélico de “representação”, contido na mímesis, como tentativa de apreensão do real. Ela não se dá por inteiro, ou se dá de forma hiper, configurando, sempre, muito mais uma performance do real. Portanto, prefiro a palavra performance para ser usada como tal. Tendo dito isto inúmeras vezes e explicado por quê, um discípulo me traz um vídeo com uma performance da Marília Orth na Bienal Internacional de Arte de São Paulo, sobre a qual já aqui escrevi anteriormente.
O vídeo traz a atriz e comediante Marisa Orth protagonizando uma "conferência dramatizada" na noite de quarta-feira (12), dentro programação da Bienal de Arte de São Paulo. Ao lado do artista espanhol Javier Peñafiel, ela leu trechos da "Agenda do Fim dos Tempos Drásticos", obra criada por Peñafiel após uma residência artística de mais de dois meses na cidade. Na "Agenda...", um libreto distribuído aos visitantes da Bienal, Peñafiel (que diz ter-se inspirado na capacidade de os paulistanos enfrentarem o caos da cidade) propõe cinco novos "tipos" de dias pelos quais as pessoas deveriam organizar seu tempo: comuns, próprios, impróprios, similares e plurais, cada um com suas características. Porém, ao contrário da sisudez que normalmente se relaciona à arte conceitual, o que pude perceber no auditório foi uma performance bastante descontraída. Com sua interpretação de texto dramatizada (ou "desdramatizada", dependendo do momento) e fazendo o artista "elaborar" conceitos como "narcisismo suave que faz com que os tempos sejam líquidos", Marisa Orth arrancou diversos risos da platéia.
Procurei me inteirar mais sobre este assunto e encontrei uma entrevista da atriz: "Eu acho que esse tipo de coisa deveria acontecer mais", disse a atriz ao UOL sobre sua performance, enquanto encorajava seu filho João Antônio a experimentar o tobogã do artista belga Carsten Höller (sem sucesso). "Com a minha primeira banda, o Luni, nos anos 80, a gente misturava muita coisa de performance, música, artes plásticas. Hoje voltou a ser tudo muito estanque, ou você faz teatro, ou você faz música, ou você faz arte." A atriz foi apresentada para Javier Peñafiel por um amigo em comum, o artista plástico Pazé, que protagoniza a versão em vídeo da "Agenda..." em exibição no terceiro pavilhão da Bienal.
A crítica está dividida, mas o artista espanhol aprovou o resultado da performance, mesmo que os conceitos bastante abstratos ("cadeia de descontinuidades", "réplicas da multiplicidade") tenham intimidado a platéia na hora das perguntas - em vários momentos, quem teve que "quebrar o gelo" foi a curadora da Bienal Ana Paula Cohen, que também é responsável pela dublagem em castelhano do vídeo de "Agenda...". "Trabalhar com a Marisa é ótimo", afirmou Peñafiel. "Essa generosidade do humor dela deixa a performance muito mais próxima, minha idéia é fazer algo bem-humorado, sem perder o foco da proposta."
Pelo que pude apurar sobre a relação texto/experimentação/performance, a dupla ensaiou durante dois meses para a performance, em um dos lofts do edifício Lutétia, mantido pela Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP) para abrigar residências artísticas. Ambos vestiam uniformes de estudantes e sentaram-se na arquibancada, mantendo a bancada da "conferência" vazia. "Eu demorei um tempo para entender a proposta", diz Marisa Orth, "mas acabei sacando a veia poética que brinca de ser científica, que é o grande barato do Peñafiel". E é ou não o grande barato da pós-modernidade? Afinal a contemporaneidade está aí se fazendo de grande palco dos diferentes, dos (des)comprometidos, das adversidades e de várias outras ODES, descontínuas ou não! A arte abre a boca ao mundo de Pantagruel! E quando vemos, estamos diante do gigante Gargântua – a própria arte em sua total e inimitável performance.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

ANIVERSÁRIO DE MORTE DE MANUEL BANDEIRA

ANIVERSÁRIO DE MORTE DE MANUEL BANDEIRA- 40 ANOS
Morte:13/10/1968
"...o sol tão claro lá fora,o sol tão claro, Esmeralda,e em minhalma — anoitecendo."
Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho nasceu no Recife no dia 19 de abril de 1886, na Rua da Ventura, atual Joaquim Nabuco, filho de Manuel Carneiro de Souza Bandeira e Francelina Ribeiro de Souza Bandeira. Em 1890 a família se transfere para o Rio de Janeiro e a seguir para Santos - SP e, novamente, para o Rio de Janeiro. Passa dois verões em Petrópolis.
Em 1892 a família volta para Pernambuco. Manuel Bandeira freqüenta o colégio das irmãs Barros Barreto, na Rua da Soledade, e, como semi-interno, o de Virgínio Marques Carneiro Leão, na Rua da Matriz.
A família mais uma vez se muda do Recife para o Rio de Janeiro, em 1896, onde reside na Travessa Piauí, na Rua Senador Furtado e depois em Laranjeiras. Bandeira cursa o Externato do Ginásio Nacional (atual Colégio Pedro II). Tem como professores Silva Ramos, Carlos França, José Veríssimo e João Ribeiro. Entre seus colegas estão Sousa da Silveira e Antenor Nascentes.
Em 1903 a família se muda para São Paulo onde Bandeira se matricula na Escola Politécnica, pretendendo tornar-se arquiteto. Estuda também, à noite, desenho e pintura com o arquiteto Domenico Rossi no Liceu de Artes e Ofícios. Começa ainda a trabalhar nos escritórios da Estrada de Ferro Sorocabana, da qual seu pai era funcionário.
No final do ano de 1904, o autor fica sabendo que está tuberculoso, abandona suas atividades e volta para o Rio de Janeiro. Em busca de melhores climas para sua saúde, passa temporadas em diversas cidades: Campanha, Teresópolis, Maranguape, Uruquê, Quixeramobim.
"... - O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.- Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?- Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino."
Em 1910 entra em um concurso de poesia da Academia Brasileira de Letras, que não confere o prêmio. Lê Charles de Guérin e toma conhecimento das rimas toantes que empregaria em Carnaval.
Sob a influência de Apollinaire, Charles Cros e Mac-Fionna Leod, escreve seus primeiros versos livres,em 1912.
A fim de se tratar no Sanatório de Clavadel, na Suíça, embarca em junho de 1913 para a Europa. No mesmo navio viajam Mme. Blank e suas duas filhas. No sanatório conhece Paul Eugène Grindel, que mais tarde adotaria o pseudônimo de Paul Éluard, e Gala, que se casaria com Éluard e depois com Salvador Dali.
Em virtude da eclosão da Primeira Guerra Mundial, em 1914, volta ao Brasil em outubro. Lê Goethe, Lenau e Heine (no sanatório reaprendera o alemão que havia estudado no ginásio). No Rio de Janeiro, reside na rua Nossa Senhora de Copacabana e na Rua Goulart.
Em 1916 falece sua mãe, Francelina. No ano seguinte publica seu primeiro livro: A cinza das horas, numa edição de 200 exemplares custeada pelo autor. João Ribeiro escreve um artigo elogioso sobre o livro. Por causa de um hiato num verso do poeta mineiro Mário Mendes Campos, Manuel Bandeira desenvolve com o crítico Machado Sobrinho uma polêmica nas páginas do Correio de Minas, de Juiz de Fora.
O autor perde a irmã, Maria Cândida de Souza Bandeira, que desde o início da doença do irmão, havia sido uma dedicada enfermeira, em 1918. No ano seguinte publica seu segundo livro, Carnaval, em edição custeada pelo autor. João Ribeiro elogia também este livro que desperta entusiasmo entre os paulistas iniciadores do modernismo.
O pai de Bandeira, Manuel Carneiro, falece em 1920. O poeta se muda da Rua do Triunfo, em Paula Matos, para a Rua Curvelo, 53 (hoje Dias de Barros), tornando-se vizinho de Ribeiro Couto. Numa reunião na casa de Ronald de Carvalho, em Copacabana, no ano de 1921, conhece Mário de Andrade. Estavam presentes, entre outros, Oswald de Andrade, Sérgio Buarque de Holanda e Osvaldo Orico.
Inicia então, em 1922, a se corresponder com Mário de Andrade. Bandeira não participa da Semana de Arte Moderna, realizada em fevereiro em são Paulo, no Teatro Municipal. Na ocasião, porém, Ronald de Carvalho lê o poema "Os Sapos", de "Carnaval". Meses depois Bandeira vai a São Paulo e conhece Paulo Prado, Couto de Barros, Tácito de Almeida, Menotti del Picchia, Luís Aranha, Rubens Borba de Morais, Yan de Almeida Prado. No Rio de Janeiro, passa a conviver com Jaime Ovalle, Rodrigo Melo Franco de Andrade, Prudente de Morais, neto, Dante Milano. Colabora em Klaxon. Ainda nesse ano morre seu irmão, Antônio Ribeiro de Souza Bandeira.
Em 1924 publica, às suas expensas, Poesias, que reúne A Cinza das Horas, Carnaval e um novo livro, O Ritmo Dissoluto. Colabora no "Mês Modernista", série de trabalhos de modernistas publicado pelo jornal A Noite, em 1925. Escreve crítica musical para a revista A Idéia Ilustrada. Escreve também sobre música para Ariel, de São Paulo.
A serviço de uma empresa jornalística, em 1926 viaja para Pouso Alto, Minas Gerais, onde na casa de Ribeiro Couto conhece Carlos Drummond de Andrade. Viaja a Salvador, Recife, Paraíba (atual João Pessoa), Fortaleza, São Luís e Belém. No ano seguinte continua viajando: vai a Belo Horizonte, passando pelas cidades históricas de Minas Gerais, e a São Paulo. Viaja a Recife, como fiscal de bancas examinadoras de preparatórios. Inicia uma colaboração semanal de crônicas no Diário Nacional, de São Paulo, e em A Província, de Recife, dirigido por Gilberto Freyre. Colabora na Revista de Antropofagia.
1930 marca a publicação de Libertinagem, em edição como sempre custeada pelo autor. Muda-se, em 1933, da Rua do Curvelo para a Rua Morais e Vale, na Lapa. É nomeado, no ano de 1935, pelo Ministro Gustavo Capanema, inspetor de ensino secundário.
Grandes comemorações marcam os cinqüenta anos do poeta, em 1936, entre as quais a publicação de Homenagem a Manuel Bandeira, livro com poemas, estudos críticos e comentários, de autoria dos principais escritores brasileiros. Publica Estrela da Manhã (com papel presenteado por Luís Camilo de Oliveira Neto e contribuição de subscritores) e Crônicas da Província do Brasil.
Recebe o prêmio da Sociedade Filipe de Oliveira por conjunto de obra, em 1937, e publica Poesias Escolhidas e Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Romântica.
No ano seguinte é nomeado professor de literatura do Colégio Pedro II e membro do Conselho Consultivo do Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Publica Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Parnasiana e Guia de Ouro Preto.
Em 1940 é eleito para a Academia Brasileira de Letras, na vaga de Luís Guimarães Filho. Toma posse em 30 de novembro, sendo saudado por Ribeiro Couto. Publica Poesias Completas, com a inclusão da Lira dos Cinqüent'Anos (também esta edição foi custeada pelo autor). Publica ainda Noções de História das Literaturas e, em separata da Revista do Brasil, A Autoria das Cartas Chilenas.
Começa a fazer crítica de artes plásticas em A Manhã, em 1941, no Rio de Janeiro. No ano seguinte é nomeado membro da Sociedade Filipe de Oliveira. Muda-se para o Edifício Maximus, na Praia do Flamengo. Organiza a edição dos Sonetos Completos e Poemas Escolhidos de Antero de Quental.
Nomeado professor de literatura hispano-americana da Faculdade Nacional de Filosofia, em 1943, deixa o Colégio Pedro II. Muda-se, em 1944, para o Edifício São Miguel, na Avenida Beira-Mar, apartamento 409. Publica Obras Poéticas de Gonçalves Dias, edição crítica e comentada. No ano seguinte publica Poemas Traduzidos, com ilustrações de Guignard.
Recebe o prêmio de poesia do IBEC por conjunto de obra, em 1946. Publica Apresentação da Poesia Brasileira e Antologia dos Poetas Brasileiros Bissextos Contemporâneos.
Em 1948 são reeditados três de seus livros: Poesias Completas, com acréscimo de Belo Belo; Poesias Escolhidas e Poemas Traduzidos. Publica Mafuá do Malungo (impresso em Barcelona por João Cabral de Melo Neto) e organiza uma edição crítica das Rimas de João Albano. No ano seguinte publica Literatura Hispano-Americana e traduz O Auto Sacramental do Divino Narciso de Sóror Juana Inés de la Cruz.
A pedido de amigos, apenas para compor a chapa, candidata-se a deputado pelo Partido Socialista Brasileiro, em 1950, sabendo que não tem quaisquer chances de eleger-se. No ano seguinte publica Opus 10 e a biografia de Gonçalves Dias. É operado de cálculos no ureter. Muda-se, em 1953, para o apartamento 806 do mesmo edifício da Avenida Beira-Mar.
No ano de 1954 publica Itinerário de Pasárgada e De Poetas e de Poesia. Faz conferência no Teatro Municipal do Rio de Janeiro sobre Mário de Andrade. Publica 50 Poemas Escolhidos pelo Autor, em 1955. Traduz Maria Stuart, de Schiler, encenado no Rio de Janeiro e em São Paulo. Em junho, inicia colaboração como cronista no Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro, e na Folha da Manhã, de São Paulo. Faz conferência sobre Francisco Mignone no Teatro Municipal do Rio de Janeiro.
Traduz Macbeth, de Shakespeare, e La Machine Infernale, de Jean Cocteau, em 1956. É aposentado compulsoriamente, por motivos da idade, como professor de literatura hispano-americana da Faculdade Nacional de Filosofia.
Traduz as peças Juno and the Paycock, de Sean O'Casey, e The Rainmaker, de N. Richard Nash, em 1957. Nesse ano, publica Flauta de Papel. Em julho visita para a Europa, visitando Londres, Paris, e algumas cidades da Holanda. Retorna ao Brasil em novembro. Escreve, até 1961, crônicas bissemanais para o Jornal do Brasil e a Folha de São Paulo.
Em 1958, publica Gonçalves Dias, na coleção "Nossos Clássicos" da Editora Agir. Traduz a peça Colóquio-Sinfonieta, de Jean Tardieu. Publicada pela Aguilar, sai em dois volumes sua obra completa -- Poesia e Prosa.
No ano seguinte traduz The Matchmaker (A Casamenteira), de Thorton Wilder. A Sociedade dos Cem Bibliófilos publica Pasárgada, volume de poemas escolhidos, com ilustrações de Aldemir Martins.
Em 1960 traduz o drama D. Juan Tenório, de Zorrilla. Pela Editora Dinamene, da Bahia, saem em edição artesanal Estrela da Tarde e uma seleção de poemas de amor intitulada Alumbramentos. Sai na França, pela Pierre Seghers, Poèmes, antologia de poemas de Manuel Bandeira em tradução de Luís Aníbal Falcão, F. H. Blank-Simon e do próprio autor.
No ano seguinte traduz Mireille, de Fréderic Mistral. Começa a escrever crônicas semanais para o programa "Quadrante" da Rádio Ministério da Educação. Em 1962 traduz o poema Prometeu e Epimeteu de Carl Spitteler.
Escreve para a Editora El Ateneo, em 1963, biografias de Gonçalves Dias, Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Junqueira Freire e Castro Alves. A Editora das Américas edita Poesia e Vida de Gonçalves Dias. Traduz a peça Der Kaukasische Kreide Kreis, de Bertold Brecht. Escreve crônicas para o programa "Vozes da Cidade" da Rádio Roquette-Pinto, algumas das quais lidas por ele próprio, com o título "Grandes Poetas do Brasil".
Traduz as peças O Advogado do Diabo, de Morris West, e Pena Ela Ser o Que É, de John Ford. Sai nos EUA, pela Charles Frank Publications, A Brief History of Brazilian Literature (tradução, introdução e notas de R. E. Dimmick), em 1964.
No ano de 1965 traduz as peças Os Verdes Campos do Eden, de Antonio Gala. A Fogueira Feliz, de J. N.Descalzo, e Edith Stein na Câmara de Gás de Frei Gabriel Cacho. Sai na França, pela Pierre Seghers, na coleção "Poètes d'Aujourd'hui", o volume Manuel Bandeira, com estudo, seleção de textos, tradução e bibliografia por Michel Simon.
Comemora 80 anos, em 1966, recebendo muitas homenagens. A Editora José Olympio realiza em sua sede uma festa de que participam mais de mil pessoas e lança os volumes Estrela da Vida Inteira (poesias completas e traduções de poesia) e Andorinha Andorinha (seleção de textos em prosa, organizada por Carlos Drummond de Andrade). Compra uma casa em Teresópolis, a única de sua propriedade ao longo de toda sua vida.
Com problemas de saúde, Manuel Bandeira deixa seu apartamento da Avenida Beira-Mar e se transfere para o apartamento da Rua Aires Saldanha, em Copacabana, de Maria de Lourdes Heitor de Souza, sua companheira dos últimos anos.
No dia 13 de outubro de 1968, às 12 horas e 50 minutos, morre o poeta Manuel Bandeira, no Hospital Samaritano, em Botafogo, sendo sepultado no Mausoléu da Academia Brasileira de Letras, no Cemitério São João Batista.
Bibliografia:
Poesia:
- A Cinza das Horas - Jornal do Comércio - Rio de Janeiro, 1917 (Edição do Autor)- Carnaval - Rio de janeiro,1919 (Edição do Autor)- Poesias (acrescida de O Ritmo Dissoluto) - Rio de Janeiro, 1924- Libertinagem - Rio de Janeiro, 1930 (Edição do Autor)- Estrela da Manhã - Rio de Janeiro, 1936 (Edição do Autor)- Poesias Escolhidas - Rio de Janeiro, 1937- Poesias Completas acrescida de Lira dos cinqüent'anos) - Rio de Janeiro, 1940 (Edição do Autor)- Poemas Traduzidos - Rio de Janeiro, 1945- Mafuá do Malungo - Barcelona, 1948 (Editor João Cabral de Melo Neto)- Poesias Completas (com Belo Belo) - Rio de Janeiro, 1948- Opus 10 - Niterói - 1952- 50 Poemas Escolhidos pelo Autor - Rio de Janeiro, 1955- Poesias completas (acrescidas de Opus 10) - Rio de Janeiro, 1955- Poesia e prosa completa (acrescida de Estrela da Tarde), Rio de Janeiro, 1958- Alumbramentos - Rio de Janeiro, 1960- Estrela da Tarde - Rio de Janeiro, 1960- Estrela a vida inteira, Rio de Janeiro, 1966 (edição em homenagem aos 80 anos do poeta).- Manuel Bandeira - 50 poemas escolhidos pelo autor - Rio de Janeiro, 2006.
Prosa:
- Crônicas da Província do Brasil - Rio de Janeiro, 1936- Guia de Ouro Preto, Rio de Janeiro, 1938- Noções de História das Literaturas - Rio de Janeiro, 1940- Autoria das Cartas Chilenas - Rio de Janeiro, 1940- Apresentação da Poesia Brasileira - Rio de Janeiro, 1946- Literatura Hispano-Americana - Rio de Janeiro, 1949- Gonçalves Dias, Biografia - Rio de Janeiro, 1952- Itinerário de Pasárgada - Jornal de Letras, Rio de Janeiro, 1954- De Poetas e de Poesia - Rio de Janeiro, 1954- A Flauta de Papel - Rio de Janeiro, 1957- Itinerário de Pasárgada - Livraria São José - Rio de Janeiro, 1957- Prosa - Rio de Janeiro, 1958- Andorinha, Andorinha - José Olympio - Rio de Janeiro, 1966- Itinerário de Pasárgada - Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1966 - Colóquio Unilateralmente Sentimental - Editora Record - RJ, 1968- Seleta de Prosa - Nova Fronteira - RJ- Berimbau e Outros Poemas - Nova Fronteira - RJ
Antologias:
- Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Romântica, N. Fronteira, RJ- Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Parnasiana - N. Fronteira, RJ- Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Moderna - Vol. 1, N. Fronteira, RJ- Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Moderna - Vol. 2, N. Fronteira, RJ- Antologia dos Poetas Brasileiros Bissextos Contemporâneos, N. Fronteira, RJ- Antologia dos Poetas Brasileiros - Poesia Simbolista, N. Fronteira, RJ- Antologia Poética - Editora do Autor, Rio de Janeiro, 1961- Poesia do Brasil - Editora do Autor, Rio de Janeiro, 1963- Os Reis Vagabundos e mais 50 crônicas - Editora do Autor, RJ, 1966- Manuel Bandeira - Poesia Completa e Prosa, Ed. Nova Aguilar, RJ- Antologia Poética (nova edição), Editora N. Fronteira, 2001
Em conjunto:- Quadrante 1 - Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1962 (com Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Dinah Silveira de Queiroz, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos e Rubem Braga)- Quadrante 2 - Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1963 (com Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Dinah Silveira de Queiroz, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos e Rubem Braga)- Quatro Vozes - Editora Record - Rio de Janeiro, 1998 (com Carlos Drummond de Andrade, Rachel de Queiroz e Cecília Meireles)- Elenco de Cronistas Modernos - Ed. José Olympio - RJ (com Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga- O Melhor da Poesia Brasileira 1 - Ed. José Olympio - Rio de Janeiro (com Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto)- Os Melhores Poemas de Manuel Bandeira (seleção de Francisco de A. Barbosa) - Editora Global - Rio de Janeiro)
Seleção e Organização:
- Sonetos Completos e Poemas Escolhidos de Antero de Quental- Obras Poéticas de Gonçalves Dias, 1944- Rimas de José Albano, 1948- Cartas a Manuel Bandeira, de Mário de Andrade, 1958
Multimídia:
- CD "Manuel Bandeira: O Poeta de Botafogo" - Gravações inéditas feitas pelo poeta e por Lauro Moreira, tendo como fundo musical peças de Camargo Guarnieri interpretadas pelo pianista Belkiss Carneiro Mendonça, 2005.
Sobre o Autor:
- Homenagem a Manuel Bandeira, 1936- Homenagem a Manuel Bandeira (edição fac-similar), 1986- Bandeira a Vida Inteira - Edições Alumbramento, Rio de Janeiro, 1986 (com um disco contendo poemas lidos pelo autor).
Dados obtidos em livros de Manuel Bandeira, e nas publicações "Homenagem a Manuel Bandeira" e "Bandeira a Vida Inteira", na Academia Brasileira de Letras e sites da Internet.

A CIDADE-COLAGEM, O DESLOCAMENTO DA LINGUAGEM, DOS MOVIMENTOS DO CORPO E A ESTRUTURA DO SENTIMENTO NO CONTO CONTEMPORÂNEO DE SÉRGIO SANT’ANNA

  1. A CIDADE-COLAGEM, O DESLOCAMENTO DA LINGUAGEM, DOS MOVIMENTOS DO CORPO E A ESTRUTURA DO SENTIMENTO NO CONTO CONTEMPORÂNEO DE SÉRGIO SANT’ANNA

    Prof. Dr. Deneval Siqueira de Azevedo Filho
    UFES

    Resumo: O objetivo deste trabalho é analisar, sob a ótica de alguns pressupostas pós-modernos, a performance da cidade-colagem e o deslocamento da relação entre realidade e representação, sujeito e (a)história que se percebe em boa parte da narrativa brasileira contemporânea. Para tal, escolhi como corpus os contos “Conto (não conto)”, “Estudo para um conto” e “Um discurso sobre o método”, de Sérgio Sant’Anna. Quero mostrar sobretudo como se dá nesta literatura o deslocamento forte do desejo, da linguagem, dos movimentos do corpo e das utopias, quase sempre, a partir de um sujeito cindido, em crise, diante de uma realidade que se tornou hostil.

    Palavras-chave: Pós-modernidade, Crise da representação, Sujeito cindido, Cidade-colagem, Contos contemporâneos

    O que aparece num nível como o último modismo, promoção publicitária e espetáculo vazio é parte de uma lenta transformação cultural emergente nas sociedades ocidentais, uma mudança de sensibilidade para a qual o termo “pós-moderno” é na verdade, ao menos por agora, totalmente adequado. A natureza e a profundidade dessa transformação são discutíveis, mas transformação ela é. Não quero ser entendido erroneamente como se afirmasse haver uma mudança global de paradigma nas ordens cultural, social e econômica; qualquer alegação dessa natureza seria um exagero. Mas, um importante setor da nossa cultura, há uma notável mutação na sensibilidade, nas práticas e nas formações discursivas que distingue um conjunto pós-moderno de pressupostos, experiências e proposições de um período precedente. (Huyssens, 1984)

    Parecem fúteis os esforços dos anos 60 (movimentos estudantis e de neovanguarda, contracultura, gay lib, pós-stonewall, movimentos feministas, etc.) para desenvolver modelos de planejamento em larga escala, abrangentes e integrados (muitos deles especificados com todo o rigor que a criação de modelos matemáticos computadorizados podia então permitir) para regiões metropolitanas. A vida da urbe contemporânea procura, hoje, estratégias pluralistas e orgânicas para a abordagem do desenvolvimento urbano como uma colagem de espaços e misturas altamente diferenciados, senão híbridos, em vez de perseguir planos grandiosos baseados no zoneamento funcional de atividades diferentes. A “cidade-colagem” é agora o tema, e a “revitalização urbana” substituiu a vivificada “renovação urbana” como a palavra-chave do léxico dos planejadores. Esta observação feita, tendo como corpus a arquitetura, nos conduz, certamente, a uma pergunta extremamente relevante em relação à condição pós-moderna: Quando se sobrepõem os paradoxos pós-modernos? A resposta, pelo exemplo, pode parecer, às vezes, muito clara. Quando a autonomia estética e a auto-reflexividade modernistas enfrentam uma força contrária na forma de uma fundamentação no mundo histórico, social e político.
    Não obstante, podem-se documentar mudanças desse tipo em toda uma gama de campos distintos. A narrativa pós-moderna, o cinema, a partir de Blade-runner, a arquitetura, a sociologia, os estudos culturais, o multiculturalismo, o pós-estruturalismo, alega McHale (1987) caracterizam-se, por exemplo, e, neste caso, mais particularmente a literatura, pela passagem de um dominante “epistemológico” a um “ontológico”. Com isso, ele quer nos dizer que há uma passagem do tipo de perspectivismo que permitia ao modernista uma melhor apreensão do sentido de uma realidade complexa, mas mesmo assim singular à ênfase em questões sobre como realidades radicalmente diferentes podem coexistir, colidir esse interpenetrar. É que no pós-moderno, praticamente, não há aquela dialética de forte oposição, ou seja, uma auto-reflexão que se mantém distinta daquilo que tradicionalmente se aceita como seu oposto – o contexto histórico-político no qual se encaixa.
    Há, sim, uma recusa em resolver as contradições e conseqüentemente uma contestação daquilo que Lyotard (1984 a) chama de narrativas-mestras totalizantes de nossa cultura, aqueles sistemas por cujo intermédio costuma-se unificar e organizar (atenuando) quaisquer contradições a fim de coaduná-las. Em conseqüência, a fronteira entre ficção e ficção científica sofreu uma real dissolução, enquanto as personagens pós-modernas com freqüência parecem confusas acerca do mundo em que estão e de como deveriam agir com relação a ele. A própria redução do problema da perspectiva à autobiografia, testumunhos, memórias, diários parece ser o cerne desta questão: segundo uma personagem de Borges, o sujeito entra num labirinto: “Quem era eu? O eu de hoje estupefato; o de ontem esquecido; o de amanhã, imprevisível? A interrogação diz-nos tudo. A narrativa “Conto (não conto)”, de Sérgio Sant’Anna, vai apontar essa marca de crise do sujeito pós-moderno nas representações, ao nos mostrar um conto “pseudo-absurdo” em suas entranhas, porém emprenhado desses questionamentos todos.
    Terry Eagleton (1996), crítico marxista, teórico da literatura e professor da Universidade de Oxford, ao questionar a pós-modernidade, mostra-nos como a desconfiança na ideologia das narrativas totalizantes e a descrença em projetos idealizadores de transformações universais estão presentes, sobretudo, no pós-modernismo que, segundo ele, é a manifestação cultural referente à pós-modernidade. Para ele, uma obra pós-moderna é “arbitrária, eclética, híbrida, descentralizada, fluida e descontínua, lembrando o pastiche.” (Eagleton, op. cit.: 21-35) Ainda acrescenta que “fiel aos princípios da pós-modernidade, rejeita a profundidade metafísica em favor de uma espécie de superficialidade forjada, jocosidade e falta de afeto, é uma arte de prazeres, superfícies e intensidades fugazes.” (Idem) Para concluir refere-se à pós-modernidade como a responsável pela desconfiança de todas as verdades e certezas estabelecidas e, por isso, a obra pós-moderna é irônica em sua forma, e sua epistemologia relativista e cética.
    Na realidade, o fracasso dos projetos tidos como universais denunciou o perigo das grandes ilusões modernas, já que elas não valorizavam a diferença – tão aclamada na pós-modernidade, mais pontualmente após o pensamento derridiano – e tendenciavam ao totalitarismo. Por tal motivo, a pluralidade cultural vem à tona, as diferenças têm que conviver abrandando e amenizando as adversidades, quando o centro fixo é questionado. A própria definição de contar uma história, de articular a trama, de escolha dos tipos/personagens é desconstruída todo o tempo em “Conto (não conto)”. Não se aceita mais a idéia de redenção das margens, da periferia ao centro, mas propõe-se um diálogo entre ambos: hibridismo plural. Na esfera do conhecimento, passa-se a pensá-lo com parte essencial dos contextos culturais, hoje, altamente mutável, diversificado, híbrido e mestiço. Tal como a linguagem, matéria prima da narrativa de Sant’Anna. A literatura, para Sérgio Sant’Anna, é intrigante cosa mentale, essencialmente neste conto em questão. Ele é dessa linhagem de criadores que são tanto mais inventivos quanto mais saturados de informações é o universo que tratam. E não estou aqui falando de metaliteratura. Isso já é uma bobagem, em se tratando que o texto literário brasileiro contemporâneo se coloca como indicador ( e estou me referindo de toda a ficção dos anos 60, 70, 80, 90 e...) das crises e conflitos de sujeitos sociais cindidos, recém-saídos de um regime totalitarista, fragmentados, sem raízes (flutuantes, pois!), à deriva, muitas vezes anêmicos e expostos à violência, seja esta da linguagem que lhe impõe uma outra postura diante do mundo, pela perfomance, seja da violência de uma vida cotidiana burocrática e impessoal, que parece ir muito além de qualquer entendimento ou controle humanos. Estão aí as narrativas cyborgianas, como exemplo. O homem-robô, a prótese do celular, dentadura da moda, agem alheios, distanciados dos problemas da urbe, apesar de nela habitarem. O homem, o sujeito que a carrega, pode ser visto em Sérgio como o homem, a carroça e suas meditações/simulações sobre o cavalo. Ele carrega, mas sem se dar conta da dependência ontológica de seus brinquedinhos-próteses. Distanciado do mundo urbano, portanto, que não reconhecem como seu, mas como algo separado, estranho e hostil, o sujeito de que tratamos vive um mal-estar na metrópole moderna e contemporânea. É recorrente a reação ao mundo urbano com violência (vide a literatura de Rubem Fonseca – uma estética da violência, performance dessa vida), ruptura de raízes, alienação, impessoalidade, empobrecimento da experiência e dos vínculos culturais, afetivos, daí derivando a imagem da metrópole enquanto cidade-colagem, como um mundo desencantado. Sant’Anna nos apresenta, por conseguinte, uma narrativa que se impõe enquanto saída para esta saturação de efeitos (de que trata Eagleton). Em “Estudo para um conto”, a saturação do universo do “Acadêmico Dancing”, das luzes e da recorrência da vírgula de “neón” que perpassa toda a narrativa , a ambiência cultural feita de “Haverás” é muito inventiva, como inventivos são os universos de Philip Glass, Bob Wilson, João Gilberto, Gerald Thomas, John Cage, só para citar alguns que usam da saturação de informações para criar uma performance.
    Se o projeto modernista propunha racionalmente uma ruptura com o passado e idealizava profundas alterações para o seu presente – as utopias – e visava ao alcance de verdades universalizantes, em contrapartida, o pós-moderno lança a desconfiança sobre essas verdades, gerando, conseqüentemente, o ceticismo e a ironia. Aquela racionalidade dos modernos cede espaço para a ausência de ordem estabelecida, o que resulta, ainda, em arbitrariedade, descentralização e descontinuidade. Logo, se o pós-modernismo reflete, de certo modo, a maneira pós-moderna de ver o mundo, temos uma produção artística de desconfiança dessas verdades, desconfiança esta que acaba por evidenciar o ceticismo e a ironia apresentados por Eagleton. É exatamente por este caminho que Sant’Anna nos rasga a fantasia e põe em cena sua literatura de homens, cobras, cavalos, uma espécie de natureza morta que quer vida. Quem lha dará?
    Em seu romance Senhorita Simpson (1993), por exemplo, essa miniaturização da representação e da realidade literária como um processo histórico de performance estética corta o fôlego. Num curso noturno de Inglês em Copacabana, freqüentado por executivos do Banco Central, investidores, sujeitos do pregão, futebolistas com um pé sonhador num clube do exterior, a cândida família Jones do livro didático salta para fora das páginas, confundindo-se com as atribulações e existência dos alunos (nas obras de Sérgio Sant’Anna, as criaturas – de papel ou não – estão sempre mudando de lado). À frente, rege uma bostoniana senhorita Simpson, a professora de inglês, que parece saída de um romance de Henry James ou Edith Wharton. É a quebra completa dos padrões de “rigidez e estratificação social”. A emblemática senhorita Simpson é consumida amplamente no interior daquela fábula anglo-americana-carioca. Neste romance, pode-se argumentar que há um estranhamento/estranheza (como também há nos contos em questão), criado pela divisão social do trabalho, pelo sistema produtor de mercadoria e pelo próprio fetiche da mercadoria, que continua uma referência crítica atual, agora que se tem um sistema global mundializado de produção, circulação e consumo de mercadorias, de coisas conversando com outras coisas, num máximo de expansão e abstração do próprio capitalismo. Esta condição pós-moderna que se pode perceber, com alguma atenção, justamente na vida cotidiana, pelas enganações, simulações e simulacros, relacionando os sinais que aí circulam, tantos e tão variados, que podem sugerir o caos, a confusão, um grau avançado de ilegibilidade [“Conto (não conto)”]. O que é, mas, ao mesmo tempo, não é correto. Ambiguamente, trata-se de avançar dessa opacidade, desse apenas aparente caos, construindo uma literatura que passa pelas aparências, pelas superfícies da vida social cotidiana, relacionando os sinais da cidade e a forma literária em outro nível de elaboração. No segundo conto, “Estudo para um conto”, “haverá uma mulher deitada”; “Haverá também um plano inferior nesse quadro, nessa mulher”, mulher-quadro, mulher-cena. “Ela ri, gosta de ser objeto desse tipo de desejo e antes simulava orgasmos.” Seguindo Freud (1996), um outro sentido de estranhamento/estranheza que, conforme o contexto, pode significar alienação, distanciamento, alheamento, e mesmo desrealização faz da personagem do conto um sujeito sempre e desde logo social, embora também sempre dividido e com impulsos agressivos, ligada a uma experiência urbana muito complexa e contraditória.
    Trata-se da maneira muito marcada, de personagem cindida (observe-se a cicatriz), com tons variados de estranhamento, em relação a si mesma e à sociedade urbana em que está, por onde circula autofagicamente à sua sombra e semelhança, alheia a seu próprio mundo cotidiano. Com gradações, é certo, indo da negação extrema (corpo invisível), que confina com a psicose, com a ruptura dos vínculos com a realidade (“... a mulher permanece assim, com sua cicatriz, suas ligas nas coxas brancas recebendo as cores do luminoso, desarmada.”) passando por graus diversos de neurose. Afastados de si mesmos e do mundo, tantas vezes não suportando as pressões e frustrações a que são submetidos, são sujeitos urbanos de papel, afastados e desligados de si mesmos, mas que dizem a que vêm.
    Isso posto, vê-se na literatura de Sérgio Sant’Anna um cotidiano configurado, ao mesmo tempo prático e simbólico, real e imaginário, próximo e distante, que mistura elementos de longa duração histórica (“Acadêmico, Dancing” – tradição!) e da contemporaneidade (“passos, passos, passos”) que tem tessitura e que, sobretudo, não pode ser direta, pois que simulada, nem transparente, visível totalmente, posto que “Haverá...” em suas articulações estéticas mais elaboradas.
    Por outro lado, voltando à condição pós-moderna, há, neste conto, uma verdadeira estrutura do sentimento pós-moderno, apesar de considerar perigoso descrever relações complexas como polarizações simples. Porém, na medida em que a narrativa não se legitima pela referência ao passado, ela enfatiza o profundo caos da vida contemporânea e a impossibilidade de lidar com ele, com o pensamento racional da forma como enfatizou Nietzsche.
    Em “Um discurso sobre o método”, a personagem é posta no centro pelo aglomerado de pessoas que julgam estar diante de um suicida no 18º. andar de um edifício, uma situação espetacular, muito bem-vinda a uma sociedade do espetáculo, aquela que adora tragédias, show, barraco, prisão, o que caracteriza, de certa forma, o que Márcia Denser chama de “apagamento da fronteira entre a alta cultura e a cultura de massa”. Quando a personagem anônima vai fumar uma baguinha de cigarro aproxima-se da beira da marquise e aí começa a se questionar, deixando o narrador, via discurso indireto livre, pastichar várias teorias, lançando sobre ele questionamentos múltiplos: “Que mundo é este?”, “O que se deve fazer nele”, “Qual dos meus eus deve fazê-lo?”. Indagações que se tornam ainda mais pungentes pelo fato de que o protagonista é um sujeito pós-moderno, carente de identidades fixas. Inumanamente, ao ser questionada pela boca do narrador, vai se transformando num “tipo” marcado por opostos, pela falta de dinheiro, projetando-se em mendigos, passivamente. Até que o corpo de bombeiros e a polícia são chamados e ele é conduzido a um manicômio, onde começa a sonhar em dar voz ao seu duplo: “uma personagem confusa e distraída que vagueia por esse mundo em seus pensamentos sem um claro sentido de localização – em que mundo estou e qual das minhas personalidades exibo?”. Frustra, assim, a platéia ansiosa pelo pulo: “Pula, pula!”.
    Ora, ao elencar tantas teorias e não encerrar em nenhuma a questão do protagonista, a narrativa ganha um “ar de descrença, ceticismo e desconfiança”. Unidos ao desejo de desconstrução, a literatura pós-moderna de Sérgio Sant’Anna é ímpar e incomparável, mais ainda, de várias funções, sobretudo pela forma com que simula, propõe, sugere e desconstrói o que ela mesma (re)cria.
    Para concluir, a atomização do social em redes flexíveis de jogos de linguagem em Sérgio Sant’Anna pode recorrer a um conjunto bem distinto de códigos, dependendo da situação simulada: sob essa condição, a linguagem ainda deve ser vista como uma cidade antiga: um labirinto de ruelas e pracinhas, de velhas e novas casas, e de casas com acréscimos de diferentes períodos; e tudo isso cercado por uma multiplicidade que nos dá a estrutura do sentimento. O que já foi versão da vida premiada moderna dinamitou-se, tornou-se inviável, como inviável tornaram-se as utopias. Estão dinamitadas.
    Contudo, ainda “Haverá música, vinda do Acadêmico Dancing. A Orquestra é boa!” Destacam-se os instrumentos de sopro. Polimorfos. Afinal, no conto em questão, não há retorno nostálgico. O passado, suas formas estéticas e suas formações sociais são problematizados pela simulação crítica. Esse irônico repensar pós-moderno sobre a não-identidade ou duplas identidades, sobre o não-lugar, sobre o não-real, em “Um discurso sobre o método”, é deliberadamente contraditório. Por isso, todos os textos lidam com a necessidade que temos de nos livrar das ilusões das explicações e dos sistemas totalizantes da ética. O que temos, então? Nada mais que a linguagem interna do contador de histórias, do simulador de vôos, presença do passado ou antecipação de um futuro. Completamente avesso à chamada literatura de fundação, à narrativa crédula do esquema nacional-popular, Sérgio Sant’Anna segue por aqui: “conhecedor de todas as trucagens da criação e do texto lierário” (Azevedo Filho, 2003), pastichador finíssimo, ele é desses criadores que se movem naquele espaço mínimo, naquela equação artística invisível, capaz de, como escritor de suspeição, avançar apontando as máscaras que há nos rostos. Faz da literatura uma alta literatura.


    Referências
    AZEVEDO FILHO, Deneval Siqueira de. “O mundo desencantado da condição pós-moderna”. In: Multiteorias. Vitória: PPGL/MEL, 2003.
    EAGLETON, T. As ilusões do pós-modernismo. Rio de Janeiro: Zahar Ed., 1996
    FREUD, S. Letters. New York: New York Press, 1996.
    HUYSSENS, A. “Mapping the post-modern”. New German Critique. , n. 35, p. 5-32, 1984.
    LYOTARD, J. The postmodern Condition. London. [s. Ed.], 1984.
    McHALE, B. Postmodernist Fiction. London: [s. Ed.], 1987.
    SANT’ANNA, Sérgio. Senhorita Simpson & Contos. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

"Homossexualidade e outros pecados", por Rubem Alves

Coluna - Folha de São Paulo - 30-09-2008
Rubem Alves
Homossexualidade e outros pecados

Cristãos Fundamentalistas são os que acreditam que as sagradas escrituras foram ditadas diretamente por Deus e que, por isso, tudo o que nelas está escrito é sagrado, verdadeiro e deve ser obrigatoriamente obedecido para sempre. A verdade divina está fora do tempo. Aquilo que Deus comandava há 3.000 anos é válido para hoje e para todos os tempos futuros.
Digo isso a propósito de uma carta dirigida a Laura Schlessinger, conhecida locutora de rádio nos Estados Unido que tem um desses programas interativos que dá respostas e conselho aos ouvintes que a chamam ao telefone. Recentemente perguntada sobre a homossexualidade, a locutora disse que se trata de uma abominação, pois assim a Bíblia o afirma no livro de Levítico 18:22. Um ouvinte escreveu-lhe então uma carta que vou transcrever:
"Querida doutora Laura, muito obrigado por se esforçar tanto pra educar as pessoas segundo a lei de Deus (...) Mas, de qualquer forma, necessito de alguns conselhos adicionais a respeito de outras leis bíblicas e sobre a forma de cumpri-las: gostaria de vender minha filha como serva, tal como o indica o livro de Êxodo, 21:7. Nos tempos em que vivemos, na sua opinião, qual seria o preço adequado?
O livro de Levítico 25:44 estabelece que posso possuir escravos, tanto homens quanto mulheres, desde que não sejam adquiridos de países vizinhos. Um amigo meu afirma que isso só se aplica aos mexicanos, mas não aos canadenses. Será que a senhora poderia esclarecer esse ponto? Por que não posso possuir canadenses?
Sei que não estou autorizado a ter qualquer contato com mulher alguma no seu período de impureza menstrual (Levítico 18:19, 20:18 etc) O problema que se me coloca é o seguinte: como posso saber se as mulheres estão menstruadas ou não? Tenho tentado perguntar-lhes mas muitas mulheres são tímidas e outras se sentem ofendidas.
Tenho um vizinho que insiste em trabalhar no sábado. O livro de Êxodus 35:2 claramente estabelece que quem trabalha aos sábados deve receber a pena de morte. Isso quer dizer que sou obrigado a matá-lo? Será que a senhora poderia, de alguma maneira, aliviar-me dessa obrigação aborrecida?
No livro de Levítico 21: 18-21 está estabelecido que uma pessoa não pode se aproximar do altar de Deus se tiver algum defeito na vista. Preciso confessar que eu preciso de óculos para ver. Minha acuidade visual tem de ser 100% para que eu me aproxime do altar de Deus?
Eu sei, graças a Levítico 11:6-8, que quem toca a pele de um porco morto fica impuro. Acontece que adoro jogar futebol americano, cujas bolas são feitas de pele de porco. Será que me será permitido continuar a jogar futebol americano se usar luvas?
Meu tio tem um sítio. Deixa de cumprir o que diz Levítico 19:19, pois que planta dois tipos diferentes de semente ao mesmo campo, e também deixa de cumprir a sua mulher, que usa roupas de dois tecidos diferentes - a saber, algodão e poliéster. Será que é necessário levar a cabo o complicado procedimento de reunir as pessoas da vila para apedrejá-las? Não poderíamos queimá-las numa reunião privada?
Sei que a senhora estudou esses assuntos com grande profundidade de forma que confio plenamente na sua ajuda. Obrigado de novo por recordar-nos que a palavra de Deus é eterna e imutável".

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

quinta-feira, 31 de julho de 2008

MÃE NEGRA - AMA DE LEITE COMO LOGO DO "CULTURA EM CARTAZ"

A "Mãe", como chamamos, carinhosamente, a obra em grafite do artista Andinho (2008), abraça a cultura campista, ao tornar-se símbolo do "Cultura em Cartaz", do "Pólo de Cinema" e do momento profícuo por que passa a Cultura Campista-goitacá. Está no cartaz, no convite e na programação dos eventos culturais da Festa do S. Salvador. Inicialmente grafitada no Palácio da Cultura, chamou a atenção do cineasta Winston Chuchill Rangel, que a colocou nas filmagens do seu longa "De todos nós Campos dos Goytacazes - Uma necessária declaração de amor".

domingo, 27 de julho de 2008

LÍDER DO GEITES RECEBE SEU SEGUNDO CERTIFICADO DE DE PÓS-DOUTORADO


O PROF. PÓS-DR. DENEVAL SIQUEIRA DE AZEVEDO FILHO, LÍDER DO GEITES, GRUPO DE PESQUISA CERTIFICADO PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO JUNTO AO CNPq E CONSOLIDADO POR ESTA INSTITUIÇÃO, RECEBE SEU SEGUNDO CETIFICADO DE PÓS-DOUTORAMENTO, DESTA VEZ PELA ARIZONA STATE UNIVERSITY, COLLEGE OF LIBERAL ARTS, INTERNATIONAL COLLEGE OF LETTERS AND CULTURES - HISPANIC RESEARCH CENTER

"TESSITURAS, INTERAÇÕES, CONVERGÊNCIAS - ABRALIC 2008


Julho de 2008. São Paulo ferve. As atividades culturais durante o 11º. Congresso Internacional da ABRALIC (Associação Brasileira de Literatura Comparada), que começou em 13 de julho e foi até 17 deste, no campus da USP, mais precisamente nas FAU e FFCL, teve de tudo: palimpsesto, na palestra de abertura do Prof. Dr. Alfredo Bosi, que continua defendendo ferrenhamente suas teses sobre a obra de Machado de Assis – “Figuras do narrador machadiano” – à conferência extremamente coerente do Prof. Dr. Frederic Jameson, da Duke University, e aos 182 simpósios que deram o arcabouço do debate ao tema “Tessituras, Interações, Convergências”. Ao mesmo tempo, paralelamente, acontecia a exposição "Mas este capítulo não é sério", no Museu da Língua Portuguesa, que tem por objetivo principal celebrar o centenário da morte de Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908), mas comemorando, por assim dizer, o eterno aniversário de vida que completa a sua extraordinária obra entre os leitores do Brasil e do mundo.
Isso sem falar em outros “momentos gozosos” da alta cultura brasileira, para a qual os celebrados pesquisadores de diversos lugares do mundo, incansáveis por buscas da apreensão do “novo”, se reúnem em mesas-redondas, tais como Henry Schwarz (Georgetown University), Tiphaine Samoyault (Univ. da Paris VIII), Ismael Xavier (USP), Cristóvão Tezza (UFPR) e Martin Kohan (Univ. de Buenos Aires) – conferencistas - , além de Susan Willis (Duke University), Jacqueline Penjon (Univ. de Paris III), Zilá Bemd (UFRGS), João Adolfo Hansen (USP), Alcir Pécora (UNICAMP), Suzi Frankl Spaerber (UNICAMP – com quem coordenei um Simpósio, no qual falei sobre a literatura narrada no teatro brechtiano) e muitos outros. O coquetel de abertura, na Casa das Rosas, casarão da Av. Paulista que abriga a obra de Haroldo de Campos, já nos dava uma idéia do que seria essa festa multicultural e cosmopolita.
Encontrei amigos que não via há 10 anos, fiz novas amizades e ouvi atentamente pessoas preocupadas em estabelecer um entrelugar na “Literatura e Dramaturgia: entre o palco e a Academia”, “Literatura e outras artes (música, pintura, dança, cinema, teatro): Leituras e relações intertextuais. No entanto, Machado de Assis sempre rouba a cena. Se não na fala de Frederic Jameson (para qualquer conhecedor da Síndrome da Bruxa Malvada babar!) – se entendesse Inglês, é claro!!! – “Realismo e Afeto” - , na exposição que celebra seu centenário de morte.
Antonio Carlos de Moraes Sartini, superintendente do Museu, assim nos situa a exposição: “"Mas este capítulo não é sério", como pouco séria, por vezes, nos parece a vida e a própria existência humana. Machado de Assis, nosso grande escritor imortal, soube, como poucos outros no mundo, retratar tão bem e com tanta crueza as mazelas da sociedade. Crítico certeiro e humorado, a partir da estimada cidade do Rio de Janeiro, há mais de 100 anos, o autor construiu uma obra absolutamente universal, pois tem como tema principal algo que está presente em toda parte e que não muda: "o Homem".
Ainda acrescenta: “O Museu da Língua Portuguesa não poderia deixar de prestar sua homenagem a este autor considerado um dos melhores do mundo no centésimo ano de sua morte. A mostra - MACHADO DE ASSIS "Mas este capítulo não é sério"- pretende aproximar o público, principalmente os jovens, do universo do " Bruxo do Cosme Velho", pretende desconstruir a imagem de escritor consagrado e inatingível e apresentar sua verdadeira e única imagem: a de um autor brilhante, atualíssimo e próximo de seus leitores. Ler Machado de Assis jamais deveria ser uma obrigação, ler Machado de Assis é, antes de tudo, um prazer imenso, uma aventura enorme, uma satisfação sem igual, ainda que, por vezes, nós leitores sejamos levados a rir de nossas próprias misérias e desgraças. Desejo que, ao visitar esta mostra, o nosso público sinta-se verdadeiramente um leitor passeando por dentro de um livro e, inspirado no grande Antonio Candido, posso dizer que mais prazeroso que visitar a mostra - Machado de Assis "Mas este capítulo não é sério"- só existe uma coisa: beber da fonte, ler qualquer uma das obras de Machado de Assis, de preferência todas!”. Isso é o que todos deveriam fazer. Esse negócio de Síndrome da Bruxa Malvada é doidice, insanidade de gente da escola do ressentimento. Vá estudar, ora bolas! Palmas para ABRALIC e para o Museu. FUUUUUUUU! Fora, gente que não tem o que fazer, ou a quem falta ambição para fazer coisas mais frutíferas! Há Bruxos e bruxinhos, afinal! Machado e machado e assim se caminha, nesta nossa Língua Portuguesa, a dos varões, não dos barões amaldiçoados pela ignorância nata.

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Festival de poesia de Berlim se dedica à poesia lusófona

Großansicht des Bildes mit der Bildunterschrift: Se Brasileiros, portugueses e luso-africanos se encontraram em Berlim, na nona edição de um dos maiores festivais de poesia da Europa, o poesiefestival berlin, que se dedica à produção lírica dos países lusófonos, misturando a poesia ao grafite e à música, e colocando Arnaldo Antunes e Chico César no mesmo palco, Campos dos Goytacazes está eufórica com a reversão do quadro, no regulamento do seu Festival de Poesia Falada, que volta a ter um perfil nacional, conservando, assim, sua tradição de dez anos. Bravo!
Em sua nona edição, o poesiefestival berlin – segundo a organização, o maior da Europa, com mais de 10 mil visitantes a cada ano – se dedicou, de 5 a 13 de julho, à poesia do mundo lusófono. Foram nove dias (e noites) de recitais, workshops, performances e debates, mas também de confrontos lingüísticos e intercâmbios literários entre representantes de países com bagagens históricas e sociais muito distintas. Esse multiculturalismo teve como graça do evento Weltklang (Som do mundo), com que a organização inaugurou o festival na noite de sábado (05/07), quando poetas contemporâneos de dez nações, todos eles consagrados em seus países de origem, apresentaram suas produções literárias no idioma original, sem traduções simultâneas, ressaltando apenas o aspecto sonoro da poesia. Bildunterschrift: Nessa noite, o brasileiro Arnaldo Antunes encontrou o português Manuel Alegre, mas também Tomaž Šalamun (Eslovênia), Hiromi Ito (Japão), Israel Bar Kohav (Israel) e Inger Christensen (Dinamarca), entre outros. Vejam o quão saudável e atual é a convivência dos poetas e a interface das culturas em se tratando de um evento internacional.
No caso do Festival de poesia Falada de Campos, pode-se dar a ele uma nova cara, acredito eu, mas no sentido de fazer com que ele cresça em intelecto, participação e know-how dos membros da comissão julgadora. Julgar valor não é brincadeira de leigos. Além disso, somos sempre a favor do crescimento e da abertura à diversidade. A literatura Nacional, mais especificamente a Poesia e o Conto, procura por Campos, seja por que via for, como procurou nesses últimos dez anos, porque Campos dos Goytacazes já faz parte de um circuito consagrado e canonizado. Não o amputemos da nossa tradição cultural, PLEASE!

Poesia + som

O ex-Titãs também dividiu o palco com Chico César para um show que já está sendo considerado pela mídia alemã como o ponto alto do evento. "Imponderáveis demais são os dois rebeldes poéticos, que dificilmente podem ser reduzidos a uma linha comum", antecipou o jornal Tagesspiegel, de Berlim. A tão óbvia quanto complexa ligação entre poesia e som também foi trabalhada no projeto e.poesie, com o qual o festival apresentou cinco compositores de música eletrônica que criaram paisagens sonoras com base em textos de poetas contemporâneos. Tudo muito interfacetado e ousado. Há, no mundo, pessoas que entendem que o entrecruzamento de vozes de diversas culturas é a saída para os conflitos mundiais, assim como os regionalismos mudos e epigônicos podem vir a ser uma ameaça às possibilidades de permutas no âmbito sócio-econômico-cultural das humanidades.
O princípio, no caso do festival de Berlim, foi simples: cada compositor escolheu um poeta cuja linguagem o impressionava e, por meio de uma cooperação que se estendeu por meses, inseriu as estrofes em um contexto sonoro. Entre outros, o americano Sidney Corbett musicou textos do alemão Johannes Jansen, e o tcheco Vit Zouhar, do austríaco Peter Waterhouse. Bildunterschrift:
Großansicht des Bildes mit der Bildunterschrift: Dois artistas norte-americanos representaram a cena de spoken word. A estudante de jornalismo Ursula Rucker se valeu de elementos de jazz, soul e triphop, unindo poesia, estilo, música e política em uma performance carregada de protestos: contra a guerra, o aborto e a onipotência da mídia, pela igualdade de direitos e os direitos da mulher. Já Mike Ladd, com um master of poetry de Harvard no currículo, reúne elementos do electro ao punk e ao pop.

Poesia + Dichtung

Mas os 210 milhões de lusófonos no mundo e as outras cerca de 20 línguas crioulas de base portuguesa foram o principal destaque desta edição. No workshop de tradução VERSschmuggel (algo como "contrabando de versos"), poetas de Portugal, Brasil, Angola, Guiné-Bissau e Moçambique se reúnem com poetas de língua alemã e trabalham juntos, com a ajuda de um intérprete, na tradução de poemas de sua autoria. Os resultados foram reunidos em uma antologia, a ser lançada na Alemanha, em Portugal e no Brasil, bem como no portal lyrikline.org.
Para encerrar, por mais interessado em culturas estrangeiras que o festival tenha se mostrado, um colóquio debateu a necessidade de se criar um centro de poesia na Alemanha. "É hora de falarmos de uma instituição como esta também na Alemanha, de um centro que exista só para esta arte e que já é realidade em diversos países do mundo", consta do programa do evento. Lição para ser copiada!
Editores, literatos e diretores de organizações semelhantes em outros países discutiram como seria possível fundar um centro que reorganizasse a memória poética alemã, avaliando a situação atual da reflexão poética e a tornando mais presente na vida cultural do país. Campos perderá a oportunidade de fazer essa reflexão, tão obviamente importante, se retirar do festival de Poesia Falada seu caráter Nacional. Já existem poetas pensando em fazer um Manifesto! Manifestos bem-intencionados são deveras bem-vindos.



quinta-feira, 19 de junho de 2008

HOMOFOBIA NÃO!!!

Preconceito, homofobia e a evolução da sociedade
*Sylvia Maria Mendonça do Amaral
As notícias recentes envolvendo homossexuais e transexuais na mídia brasileira nos dão a noção exata de que o preconceito é a principal barreira contra a evolução do Direito e da sociedade. Existe uma resistência contra os novos caminhos e as novas famílias que estão se formando no Brasil e no mundo. Um casal de militares gay assumiu publicamente seu relacionamento e uma professora transexual, mesmo aprovada em concurso público, foi impedida de assumir o cargo, provavelmente por homofobia. Esses dois casos ilustram esse cenário.E esse preconceito que emana de grande parte da sociedade ganha terreno já que não existe uma lei específica que proteja e garanta direitos ao segmento GLBTT. A favor dessa parte da população existem preceitos constitucionais que garantem a todos o direito à igualdade, dignidade e privacidade, que apesar de não serem obedecidos, fundamentam a defesa de direitos, inclusive ações indenizatórias pela prática de atos discriminatórios.Não podemos negar, infelizmente, que a homofobia está presente em nosso país. Os atos homofóbicos partem de todos os lados, de todas as maneiras, de uma palavra vulgar a assassinatos. Além dos casos já destacados anteriormente, vale relembrar também o episódio que envolveu o jogador Richarlyson, do São Paulo Futebol Clube. O juiz da 9ª Vara Criminal de São Paulo, Manoel Maximiano Junqueira Filho, mandou arquivar o processo movido pelo jogador contra um dirigente do Palmeiras que, em um programa de televisão, insinuou que o atleta era homossexual. Em seu despacho, entre inúmeras declarações homofóbicas, o juiz afirmou que "não poderia jamais sonhar em vivenciar um homossexual jogando futebol".Assim como o "caso Richarlyson", o desdobramento do ocorrido com o casal militar gay nos assusta e demonstra a intensidade da homofobia presente em todos os segmentos de nossa sociedade. Os militares que assumiram sua homossexualidade vêm sofrendo uma série de pressões no Exército, que nega de forma veemente a discriminação. Eles são exemplos claros de preconceito.O cenário só não é mais negativo porque nos últimos anos o Judiciário vem tomando rédeas e colocando sob o manto da legalidade e proteção devida pelo Estado os homossexuais que buscaram judicialmente seus direitos. Reconheceu uniões estáveis, mesmo quando nosso Código Civil e Constituição Federal falam em união estável entre um homem e uma mulher. Algumas decisões foram favoráveis, fazendo com que os homossexuais tenham saído vitoriosos em demandas e pleitos que servirão como base para os próximos pedidos semelhantes. É a jurisprudência, tão importante na obtenção de novas conquistas. Porém, a maior parte das sentenças permitiu, indiretamente, que fosse mantida a prática da discriminação, inclusive dentro de nossos tribunais.A Secretaria de Justiça de São Paulo responsável pela aplicação de penas contra aqueles que discriminam homossexuais e transexuais, de acordo com a Lei estadual nº 10.948/2001, multou neste ano, por duas vezes, uma associação e um homem que agiram de forma homofóbica. Foram as duas primeiras penas de multa já que o mais comum era a pena de advertência. Em um dos casos uma associação de servidores públicos foi multada em quase R$ 15 mil por não ter aceito o pedido de funcionário público da capital paulista para inclusão de seu companheiro como dependente. No segundo caso, em Pontal, cidade do interior do Estado de São Paulo, um homem de 27 anos foi multado no mesmo valor por ter chamado um homossexual de "veado". O pequeno número de multas aplicadas justifica-se diante das poucas denúncias que a Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania recebe. Poucos conhecem essa lei que pode ser usada como uma “arma” no combate ao preconceito.O Poder Judiciário em alguns casos tem cumprido sua função de distribuir a justiça. Porém, o Legislativo não tem acompanhado as evoluções de nossa sociedade, principalmente no que diz respeito aos homossexuais, omitindo-se de legislar em favor desse segmento, o que faz com que permaneçam à margem da lei, sem qualquer proteção por parte do Estado. Todos os projetos de lei que dizem respeito à defesa de seus direitos são engavetados o quanto antes, e só são levados à debate apenas quando nossos representantes na Câmara e no Congresso sofrem grandes pressões da sociedade e de seus pares que têm intenção em promover a igualdade. Existem bancadas no Congresso, como a católica e as evangélicas, que são terminantemente contra a aprovação de projetos dessa natureza e se utilizam de inúmeros artifícios para barrá-los.O Legislativo pode e deve colaborar para a concessão de direitos aos homossexuais. Já permitiu que se incluísse no texto da lei Maria da Penha a proteção abrangendo todas as mulheres, independentemente de sua orientação sexual, contra a violência doméstica. É necessário apressar a aprovação do projeto de lei que criminaliza a homofobia (PEC 122), que vai considerar crime agir com preconceito em relação aos homossexuais, tal como ocorre em relação aos negros. Deveria também dar atenção especial e colocar em votação, de forma urgente, o projeto de lei que regulamenta a "união estável" entre pessoas do mesmo sexo, parado há mais de uma década o que faz com que sejam fundamentais algumas atualizações em seu texto.Só com atitudes dos nossos representantes no Congresso Nacional é que conseguiremos começar a mudar esse cenário trágico de discriminação e preconceito. Para se mudar a mentalidade de uma nação é preciso mais do que leis, mas elas certamente determinarão o início de uma nova fase da busca pela igualdade, direito essencial previsto em nossa Constituição Federal.
Sylvia Maria Mendonça do Amaral é advogada especialista em Direito de Família e Sucessões, autora do livro "Manual Prático dos Direitos de Homossexuais e Transexuais" e editora do site Amor Legal.

domingo, 4 de maio de 2008

LETRAS NA VITRINE

LETRAS NA VITRINE
Sarita Erthal
(mestranda em Cognição e Linguagem – UENF)

I – Da magia ao mercado

Com influência do capitalismo, as artes em geral sofreram um abalo em suas significações. Anteriormente a esta época em que tudo é transformado em mercadoria, o artista se expressava da forma que melhor lhe convinha. Antes ainda, a arte mágica
[1] traduzia as necessidades do homem que, imitando a natureza, foi descobrindo como se usufruir dela e dominá-la. Para este homem, a arte se resumia a um “instrumento mágico, uma arma da coletividade humana em sua luta pela sobrevivência” (Fischer, 2002: 45).
Será que é possível afirmar que ainda existe alguma magia relacionada à arte? É sabido que a arte produzida na atualidade não é “pura” como a do homem pré-histórico e dos que vieram alguns anos depois dele, desprovida de intencionalidade de mercado, voltada apenas para necessidades antropológicas. Ao contrário do que ocorria, mesmo após sua evolução, já com a capacidade de compreender, suportar e transformar a realidade em que vivem, muitos artistas de hoje – desde o advento do capitalismo – vêem-se atados ante sua imaginação criadora em prol da preocupação de agradar ao público com seus trabalhos (antes do capitalismo, raras vezes senhores ou reis faziam exigências com relação a esse tipo de trabalho, como se fossem encomendas). Isso faz com que o valor de certos tipos de manifestações artísticas seja questionado e criticado por muitos. Antes de agradar a si próprio, o artista vive o impasse da aceitação do mercado. Sua realização pessoal seria a conseqüência daquela. “Agradar ao público” seria o objetivo crucial daquele; essa não concretização acarretaria o fracasso. Tal dilema tanto incomoda alguns criadores que serve de mote para determinadas obras.
Sob este prisma, a cultura de massa tem tomado um espaço considerável nas artes e mudado as formas de fazê-la e apreciá-la. O capitalismo precisa da cultura de massa para sobreviver, visto que ela compõe grande parte da população mundial. Muitos artistas se vêem, portanto, obrigados a criar algo que satisfaça aos interesses deste público. Em um mundo manipulado por relações comerciais que objetivam o lucro e a riqueza, a arte é mais um objeto a ser vendido e consumido, e para que se enquadre nos padrões de competitividade, é preciso que agrade ao maior número possível, e que as atinja de modo também massificante.
A energia elétrica e, conseqüentemente, a tecnologia foram os grandes responsáveis pela propagação da arte de massa. Eric Hobsbawm (1995: 192) atribui ao cinema a grande responsabilidade da “fertilização” das artes de vanguarda com as de massa: “em fins da década de 1930, para cada britânico que comprava um jornal diário, dois compravam um ingresso de cinema”. Alain Touraine (1994: 162) diz que “o cinema destruiu a distância que as grandes obras do teatro e da música criavam, e seu objetivo principal é a integração do indivíduo na multidão”. E apesar de Leo Lowenthal (in Tourine, 1994: 162) reconhecer a presença de “um sabor de felicidade” no cinema e na cultura de massa, “os filósofos da Escola de Frankfurt vêem nesta cultura instrumento de repressão e não de sublimação, de escravização, portanto”. A alienação, característica da sociedade de consumo fez com que o homem trocasse a razão pela instrumentalidade. O pensamento racional e os sentimentos de piedade e humanidade foram desaparecendo e sendo substituídos por uma subjetividade indomável cada vez mais atrelada ao capitalismo. Touraine (op. cit.: 165) considera atual a influência da Escola de Frankfurt, pois:
uma sociedade dominada pela produção, pelo consumo e pela comunicação de massa tende a reduzir os indivíduos a preencher papéis que outros definiriam para eles, e esta forma moderna de dependência, muito diferente daquelas das sociedades tradicionais que submetiam o indivíduo a regras e ritos, é igualmente temível mas é preciso acrescentar que é menos exigente e que a imagem da sociedade-máquina, sujeita a determinantes estritos, corresponde mais a representações antigas da ciência do que a suas expressões modernas.

Mais tarde, veículos de comunicação de massa, como o rádio e a televisão – em especial, o último –, tornam-se grandes aliados para a propagação de uma “nova” cultura por estarem presentes na grande maioria das residências. Mesmo com a favorável tecnologia, não seria possível alcançar o objetivo capitalista se o que fosse veiculado não agradasse ao público. Para isso era necessário tratar de temas que despertassem o interesse e fizessem com que as pessoas parassem diante da TV, sintonizassem o rádio, comprassem revistas e lessem os jornais ou os livros que se enquadravam em “padrões vendáveis”.
Infinitos são os temas tratados pelos veículos de comunicação, porém dois deles têm estado em evidência na contemporaneidade: a violência e o sexo. Estes tópicos são recorrentes na cultura de massa, como se pode notar em músicas, filmes e telenovelas voltadas para o público contemporâneo. A aceitação do sexo como tema estaria no fato de causar satisfação própria, estimulando os desejos de vivenciar alguma situação; por outro lado, a violência agradaria por acometer o outro, como se fosse algo inatingível a quem consome este tipo de arte. Em ambos os casos, no sujeito, é gerado certo prazer. Pode ser que haja, também, uma repulsa, mas neste caso, os artistas e propagadores desses produtos tendem a ser cautelosos para que não aconteça o afastamento do consumidor. Dificilmente a repulsa acomete o devorador da arte de massa.
Ernst Fischer (2002: 249) imagina como seria a arte perante uma sociedade próspera e altamente diferenciada, alegando que não há por que temer caso ocorra o seu empobrecimento, e ao arriscar um palpite quanto ao futuro, diz que “nosso atual gosto pelo grotesco e pela bufonaria na arte, pode ser mais do que a mera conseqüência da justaposição do cômico ao terrível, realizada pela vida moderna, pode ser o prenúncio de uma ressurreição da comédia”. Ele conclui que se houver aí a significação crítica e o riso que destrói, essa pode ser uma forma de reflexão da alegria da liberdade humana, do espírito dessa alegria (Idem). Touraine (1994: 171) acredita que a crítica social e política das idéias de Marcuse “corre o risco de negligenciar o essencial, que se situa no âmbito cultural”:
A cultura moderna é antes de tudo dessublimante; ela conduz a uma sexualidade completamente imersa no sexo e na busca da satisfação imediata e direta das necessidades. Todo distanciamento, toda “bidimensionalidade” tendem a desaparecer. Isso faz triunfar o instinto de morte na sociedade industrial e destrói a arte. “O princípio do prazer absorve o princípio da realidade, a sexualidade é libertada (melhor, liberada) sob formas socialmente construtivas. Esta noção implica que há formas repressivas de dessublimação”. (Idem)

A arte mágica, como se vê, tem se distanciado dos homens e vem sendo esmagada pela arte de consumo, do lucro, de massa. Para que esse cenário se complete, a figura do mercador cultural surge como a esperança do artista anônimo em alcançar o seu reconhecimento. Vale salientar que ser reconhecido, para ele, significa ser vendido, nem que, para isto, a efemeridade contemporânea varra seus vestígios da memória do consumidor em pouquíssimo tempo, desde que deixe um bom crédito que lhe garanta o futuro.

II – A literatura e a massa

É certo que a televisão é a campeã em termos de propagação dos temas citados anteriormente, porém escritores considerados da alta literatura também se utilizam deles em grande proporção em seus trabalhos. O efêmero, o agora e o “eu” fazem parte desta escrita assim como experiências cotidianas que, adicionadas ao imaginário do escritor, geram uma obra espelhada em questões que são atuais ou, até mesmo, afligem o homem do nosso tempo. Se questões como a violência – física ou não – e o sexo são recorrentes, Rubem Fonseca é um dos escritores contemporâneos que aborda essa temática com peculiar brilhantismo, somando-a ao grotesco, ao mundo da sobrevivência, à problemática social e urbana sem qualquer preconceito ou encobrimento. Caio Fernando Abreu carrega em sua obra um altíssimo teor social, sua visão deixa transparecer valores e ideologias que primam pela liberdade individual, tanto no que diz respeito à política quanto ao sexo.
Therezinha Barbieri (2003) busca estabelecer traços comuns à narrativa brasileira dos anos 70, 80 e 90 dialogando com a diversidade característica do mundo atual, em que a veiculação da cultura é feita predominantemente pela mídia. Destaca, portanto, alguns itens relevantes para a compreensão desta literatura. São eles: a profissionalização do escritor, a apropriação de elementos reais e a comutação entre História e ficção.
A profissionalização do escritor e a conseqüente preocupação com o leitor revelam que já não basta, como forma de repercussão, o prestígio alcançado por uma obra pelo simples boca-a-boca feito por leitores especializados. O fato de ter sua obra não somente vendida, mas bem vendida, (ou, quem sabe, um best seller) é o objetivo final de quase todo artista. Seria este o meio de ele sentir que a aceitação do mercado funciona como um termômetro para a qualidade de seus trabalhos? Há como afirmar que a qualidade literária pode ser medida pela quantidade de venda de um livro em face de fenômenos mercadológicos que conquistam e abarcam aqueles que admiram a cultura de massa? Por ser constituída de um grande público, esta classe é o alvo principal dos mercadores culturais, aqueles que visam aos negócios, independentemente da qualidade da obra. Porém, “escrever significa entrar na disputa de um lugar no mercado independentemente da vontade explícita do autor” (Barbieri, 2003: 30). Silviano Santiago (in Barbieri, Ibidem: 39) diz quanto à coincidência da popularidade com a qualidade da obra que:
não é difícil imaginar qual é o ideal do escritor dos anos 80: bom contrato, boa publicidade, boa vendagem. De quebra, boa qualidade. Para alguns críticos mais impertinentes, isso é pouco. Para os próprios escritores, sempre mais afinados com o tempo do que o crítico, isso é suficiente para definir um novo perfil do escritor e da obra literária no Brasil.

Rubem Fonseca é um exemplo de escritor inserido no mercado, quando se trata da profissionalização do autor. Ele próprio aborda essa questão em O caso Morel, quando Magalhães pede a Paul que escreva um livro:
“Paul”, disse Magalhães, dramaticamente, “eu dou toda a liberdade para você fazer o que quiser. O mundo só pensa em sexo, tudo é sexo, regime para emagrecer, cirurgia plástica, cosméticos, moda, cultura, religião, política, poder, ciência, arte, comunicação, está tudo a serviço do sexo!”
“E o que eu tenho com isso?”
“Eu pago bem (...).” (Fonseca, 1995: 62).

Barbieri (op. cit.: 29) ressalta como, em Bufo & Spallanzani, Rubem Fonseca ironiza a profissionalização da escrita: “eu não sou funcionário público, como o Sr., só ganho se trabalho, meu livro novo está muito atrasado, [...] precisava escrever um Bufo & Spallanzani a cada dois anos”. Quando se trata de seduzir o leitor, ele diz:
Voltei para o quarto e voltei a escrever Bufo & Spallanzani. [...] “Não inventa, por favor. Você tem leitores fiéis, dê a eles o que eles querem”, dizia o meu editor. A coisa mais difícil para o escritor é dar o que o leitor quer, pela razão muito simples que o leitor não sabe o que quer, sabe o que não quer, como todo mundo; e o que ele não quer, de fato, são coisas muito novas, diferentes do que está acostumado a consumir. (FONSECA, 1985: 170)


O intercâmbio intersemiótico é outro ponto que Barbieri (op. cit.: 33) destaca como decorrência da tentativa do escritor de inserção da sua obra no mercado. Dialogando com outros meios de comunicação, muitas vezes têm-se “a impressão de assistir a atores que representam, em vez de acompanhar personagens em processo de autodesvelamento, específico da narrativa literária”. Onde andará Dulce Veiga?, de Caio Fernando Abreu (2003), é uma obra carregada de jogos intertextuais como literatura, cinema e música. Caio, desse modo, ficcionaliza elementos reais ao inseri-los em seu texto. A música considerada de Dulce Veiga no referido romance é a canção Nada além, composta em 1941, por Custódio Mesquita e Mário Lago.
O permeio entre ficção e História também é destacado pela crítica como forma de “ampliar o espectro de leitores e de transformação qualitativa da linguagem romanesca” (Barbieri, 2003: 35). O que Caio (op. cit.: 37) faz com especial destreza: “Do rádio saíam os primeiros acordes da Voz do Brasil”, e ainda: “Nas paredes que eu limpara de todos os vestígios de Lidia – Che Guevara, John Lennon, Charles Chaplin – havia apenas um poster gigantesco, quase dois metros de largura” (Ibidem: 40).
O artista luta por mais espaço buscando se diferenciar entre os vários produtos da cultura de massa, recusando a padronização e valorizando sua voz, sem deixar de dialogar profundamente com esta cultura (Barbieri, op. cit.: 35). O fato de produzirem obras com a temática que agrada às massas não faz de Rubem Fonseca e Caio Fernando Abreu escritores de menor valor. Pelo contrário. Eles se sobressaem justamente por terem uma habilidade especial de expressar esses mundos e criticar, denunciar uma determinada realidade social.
Sob esse aspecto, a literatura de Caio discute problemas da experiência humana e conflitos sociais que acometem, de certa forma, a realidade ou o imaginário das pessoas. Não é pelo favorecimento da temática do sexo ante a sociedade de massa que o escritor trata desse tema com tanta freqüência, discorrendo de forma tão natural e sem limites. Os textos de Caio possuem, antes de tudo, um teor crítico que nos permite uma leitura de desabafo ou muitas vezes desgosto. O texto ficcional cria um mundo a partir de um outro e faz com que olhemos de outra forma para a realidade da qual o texto saiu
[2].
Gilda Bittencourt (1999: 85) diz que a coletânea O ovo apunhalado (Abreu, 2001) representa artisticamente uma sociedade corrompida pela era do capitalismo, da desumanização, da exploração do homem pelo homem, dos quais decorrem a formação proliferada de sujeitos solitários e coisificados. Para ela, na obra de Caio, “são mostrados igualmente os mecanismos perversos de apropriação do sistema para criar valores artificiais a serem cultivados como positivos pela massa e consumidos como mercadoria pela sociedade” (Idem). Esses “valores artificiais” são criticados peloo escritor, alertando para os riscos que uma sociedade pode ter devido à cultura massificada.
Na coletânea Morangos mofados (Abreu, 2005), o homoerotismo é a temática de muitos contos. Abordando este tema, colocando a linguagem considerada vulgar no mesmo plano da culta, Caio mostra o lado oposto dos padrões morais. Seus personagens são tanto heterossexuais como homo e bissexuais e suas características são bastante diversificadas: amor, ódio, movimento, fala e atos são singulares em cada um. Muitos deles vivem isolados, carregados da subjetividade que tem marcado a literatura brasileira contemporânea.
Alexandre Jairo Marinho Moraes (2002: 19-20) acredita que os textos de Rubem Fonseca e Caio Fernando Abreu se entrecruzam no modo como resgatam o presente e que “perfazem um mapa e este roteiro certamente é o dos sobreviventes e o dos pactários”
[3] e continua dizendo que eles fazem uma literatura que:
provocava uma diluição dos paradigmas e formas comuns ao restante da literatura então produzida. O brutalismo, presente na obra de Rubem Fonseca, encena a transformação dos paradigmas modernos de gestos e subjetividades, sobretudo da realidade brasileira, ainda que possamos ver uma espécie de generalização dos riscos de sobrevivência nas sociedades “pós-industriais” – muitíssimo mais nas menos industrializadas – e da imprevisibilidade tão característica destes nossos tempos.

O crítico ainda afirma que “a miséria e uma espécie de brutalização e/ou banalização do homem violento e da atrocidade não são apenas um gosto pelo espetáculo sedutor da violência e por uma espécie de encontro com o grande público consumidor da ficção servida às massas” (Ibidem: 21-22). E, continua dizendo que, ao contrário:
a violência (e sua generalização) não encontra no corpo apenas a sua forma explícita. Rubem Fonseca encena os diversos tipos de violência. O brutalismo e os conceitos de real que tenta desvendar e criar são produtos de um homem inserido na imprevisibilidade e na brutalidade de um tempo e suas matrizes, ou seja, nos circuitos de comunicação em ‘pontos nodais’ de sua eficácia e, simultaneamente, de sua insuficiência. (Idem).

O sentido da violência e a genealogia do banal marcam a obra de Rubem Fonseca. Assim, Alexandre Moraes (op. cit.) pensa que aquele escritor marca sua obra com uma “condição pós-moderna” recheando seus trabalhos com a insegurança do sujeito, a diluição dos paradigmas modernos e criando contradições, identidades, subjetividades e práticas sociais.
Em Caio, o brutalismo não é tão evidente como em Fonseca, mas podem-se notar diversos tipos de violência em suas obras. No entanto, ela está camuflada em uma ironia fina que se alastra em seu texto.
As literaturas de Caio Fernando Abreu e Rubem Fonseca põem à tona os grandes problemas da condição histórica em que estão inseridas. Moraes (Ibidem: 23) fala da morte e da “perda do sujeito moderno” como tema conseqüente desse contexto real:
Em Caio, a morte do sujeito é tematizada como forma e fluxo de um olhar que percorre o corpo e seus órgãos, o corpo e seus desdobramentos e sentidos multidirecionados, quer dizer, a morte do texto de Caio Fernando Abreu, não diz respeito ao corpo e seu imediatismo apenas, mas ao corpo e suas ligações, filamentos que se espraiam por toda a superfície de criação subjetiva socialmente elaborada. O corpo inunda o texto, sexualiza e torna a metafísica do corpo uma possibilidade sempre entreaberta, sempre disponível ao consumo do sujeito.

É o que Fischer (2002: 226) caracteriza como uma “realidade sem perspectiva, valor ou medida”; e exemplifica com o romance Le Voyeur de Robbe-Grillet que “representa a quintessência do método que Nathalie Sarraute enxergou em Proust”:
as pessoas não passam de meros objetos entre outros objetos, um assassinato não significa mais do que a venda de um relógio, um crime tem tanta importância como o barulho de uma gaivota no mar, um acontecimento não significa mais do que um sonho confuso e a falsa evidência de um testemunho. (Idem)

Uma leitura superficial de Rubem e Caio mostraria um mundo violento, personagens sem sentido que vagam pela cidade sem qualquer paradigma, perdem seu corpo em troca de prazeres e momentos de entrega sôfrega em que a banalidade reinaria ao longo de suas páginas. O leitor da cultura de massa se sentiria satisfeito e completo por ter em tais textos o que por vezes não é exibido pela televisão. Esta pode até insinuar algumas situações e cenas que só seriam finalizadas pela imaginação, malícia e vivência de quem a assiste. A literatura da qual tratamos usa, com certa freqüência, cenários e tipos que poderiam ferir este telespectador, caso fossem televisionados do mesmo modo em que são narrados. A televisão busca trazer à tona as utopias da maioria da população e, para tal, mostra o produto pronto e acabado: basta ao sujeito deglutir o que consome. A imaginação não precisa ser construída, os personagens têm carne e osso, voz e movimento.

III – Dupla leitura

Caio Fernando Abreu e Rubem Fonseca, sob um primeiro olhar, mostram textos cujo núcleo temático gira em torno dos temas mais consumíveis na atualidade, como já dissemos, a violência e o sexo. Porém, com um pouco mais de cuidado, percebemos que “a trama policial não está a serviço apenas da curiosidade gerada pelo desvendamento de um mistério e o enredo perpassado por situações eróticas não pretende somente prender a atenção do leitor ávido por este tipo de assunto” (Figueiredo, 200-[?]).
Essa vertente da literatura marcada pela ambigüidade nos propósitos e por um estilo que se propõe a trabalhar a multiplicidade de códigos é analisada por Vera Follain de Figueiredo (op. cit.). A pesquisadora afirma que ao unir composições populares que fogem da mesmice à elaboração de um desenredo, escondendo códigos filosóficos, culturais e semióticos, “recupera-se o desfrutável, oferecendo uma dupla leitura. Uma que permite ao leitor comum o divertimento de uma superfície e outra que exige do leitor especializado a astúcia de ir além das facilidades aparentes”.
Desse modo, o escritor tenta se fazer presente ante o mercado enquanto se esforça para manter viva “a” literatura. A linguagem vulgar muitas vezes empregada por Caio e Rubem Fonseca, atrelada à superficialidade que o leitor comum consegue obter em suas obras, funciona como um artifício para não deixarem morrer a alta literatura, na tentativa de atingirem a um público maior. O diálogo entre Paul Morel e Ismênia retrata o dilema do artista com relação a sua produção:
Toda arte acabou ou só essa que agente faz?
Acabou tudo. Kunst ist überflüssig. Acabou tarde.
É. Nós deveríamos fazer outra coisa, menos inútil. Precisamos fazer uma arte que realmente atinja o povo. O povo precisa da arte.
O povo é influenciado por críticos e connaisseuurs de merda. No Louvre há sempre uma multidão de idiotas olhando reverentemente a Vênus de Milo (Fonseca, 1995: 49).

Apenas por esta frase, “precisamos fazer uma arte que atinja o povo”, poderíamos dizer que há interesse em alcançar um público mais numeroso. Não parece recompensador, portanto, produzir arte para as pessoas que admiram a alta cultura. Recompensador, aqui, não se refere à satisfação do ego cheio de elogios e aplausos como por ter uma obra pendurada em uma parede fria de um museu, cercada por olhos cultos que param diante dela com os braços para trás, contemplam e passam para a próxima. Atingir o povo significa também obter lucro, ter um público enlouquecido e alienado sobre questões culturais que para ele são uma grande besteira. A frase seguinte, “o povo precisa da arte”, põe em pauta a preocupação com a questão social. Em meio à pobreza, desigualdades, preconceitos, violência de todo tipo que circundam o homem contemporâneo, a arte poderia ser uma válvula de escape, uma forma de fazer esquecer, pelo menos por alguns momentos, o dia-a-dia angustiante da população em geral. “O povo” se refere à grande fatia populacional, àqueles que não têm acesso à alta cultura, às vanguardas, mas que nem por isso perdem o direito ao entretenimento.
Uma personagem de Rubem Fonseca diz:
O escritor é vítima de muitas maldições, mas a pior de todas é ter de ser lido. Pior ainda, ser comprado. Ter de conciliar sua independência com o processo de consumação. Kafka é bom porque não escrevia para ser lido. Mas por outro lado Shakespeare é bom porque escrevia de olho no shilling que cobrava de cada espectador. (V. Panofsky). Assim como o teatro não se salvará apenas com a vontade de escrever peças que ninguém queira assistir, a literatura também não se salvará apenas com a coragem de escrever outros Finnegans Wake (Fonseca, 1985: 177).

Discutindo a autonomia da arte, o escritor “conquista a cumplicidade do leitor cultivado, fazendo com que este perceba os mecanismos de concessão ao gosto do público maior como jogo astucioso do autor, com o qual se identifica” (Figueiredo: op. cit). Vera Lúcia afirma, ainda, que a “alusão à história interna do campo literário, por meio das referências de um romance a outro, conferindo à narrativa um grau de reflexividade, funciona, como observa Bourdieu, como uma piscadela do autor para o leitor capaz de apropriar-se das obras e não apenas da história contada” (Idem). Assim, o escritor é capaz de atender às exigências do mercado rejeitando qualquer subordinação às suas leis.
Diante de um cenário globalizado, a verdadeira arte, aquela a que Rubem Fonseca se refere, se dilui. Concorre-se com os que têm a facilidade de mostrar seu trabalho por terem conseguido um passageiro patrocínio para financiá-lo, gerando, é claro, o lucro, objetivo principal desse tipo de artista. Isso é observado com a música que leva a massa ao delírio e os críticos ao pesadelo, e que daqui a poucos anos (ou meses) é bem provável que não nos lembremos sequer da melodia delas. É uma “arte” que apenas entretêm, diverte.
No que diz respeito à dupla leitura, a conversa entre Paul Morel e Ismênia (transcrita anteriormente), demonstra a preocupação de Rubem Fonseca com relação ao valor da arte. A alta cultura parece não ter mais espaço, principalmente se o comércio está em questão. Ismênia, portanto, conclui que eles deveriam fazer outra coisa “menos inútil. Precisamos fazer uma arte que realmente atinja o povo. O povo precisa de arte” (FONSECA, 1995: 49). Ao dizer que precisam “fazer uma arte que atinja o povo”, a personagem se atenta à popularização da mesma, como se de nada adiantasse a arte intocável, inatingível e sem utilidade para aquelas pessoas. A falta de interesse por parte do público seria, do ponto de vista de Morel, culpa dos críticos formadores de opinião que influenciam as pessoas. Rubem não aborda nesse trecho a “qualidade” da cultura da qual essas pessoas dispõem, mas isso nos faz pensar que a que ele tenta preservar não está ao alcance de todos.
Em O caso Morel, Rubem (1995: 60) cita Hesíodo: “Não tenho esperanças no futuro de nosso país. Nossa juventude é insuportável, sem educação, terrível”, e expressa pessimismo diante do estado social e político do País. A citação é um grito de socorro com relação à formação geral do jovem brasileiro. Se dizem que o jovem é o futuro de uma nação, muitos são os problemas que assolam sua educação e impedem sua boa formação como cidadão. Sem esperanças, Morel considera um escritor tão sujo quanto um advogado ou um policial, pois todos eles lidam com questões sociais. E como estas questões envolvem todos os aspectos do ser humano, não há como serem limpas, transparentes. Apesar do quadro que traça para a arte, o protagonista diz que gostaria de ser escritor caso pudesse escolher outra profissão, e em tom bastante irônico, fala que escreveria um livro que teria “do princípio à página quatrocentos, um parágrafo único, compacto, coerente, consonante”, que contivesse apenas: “A. M. Carvalho, oitenta anos, come filé com fritas. Seu neto, dezesseis anos, come o mesmo prato. Investimentos diferentes. A. M. Carvalho, oitenta anos, come filé com fritas etc...” (Fonseca, 1995: 38).
Esta é a arte do nosso tempo, a que nos faz pensar e repensar sobre nosso fazer político e social ou que, simplesmente, distrai. Os escritores que lutam para se manter no mercado temem o apagamento da arte que eles consideram verdadeira. Há quem conteste que a literatura seja mais um produto a ser consumido. Em 1940, em carta a Octavio Paz, Ezra Pound diz:
Pelo amor de Deus, medite sobre aquilo que eu lhe disse uma vez: nada do que se escreve por dinheiro vale sequer um amendoim; a única coisa que vale é aquilo que se escreve contra o mercado. Não existe veneno pior que o dinheiro. Se recebemos um bom cheque, pensamos imediatamente que fizemos alguma coisa, mas pouco tempo depois já não corre sangue em nossas veias, corre dinheiro. (Paz, 1993: 106).

No início, Paz concorda com Pound, mas depois chega à conclusão que “é impossível lutar contra o mercado ou negar suas funções e seus benefícios” (in Barbieri, 2003: 40). Na contemporaneidade, não há como negar a magia mercadológica. Assim, apenas o leitor crítico tem ainda a capacidade de escolher o que ler, não se deixando influenciar pela mídia... Será?


V – Referências

ABREU, Caio Fernando. Morangos mofados. Rio de Janeiro: Agir, 2005.

ABREU, Caio Fernando. Onde andará Dulce Veiga? Um romance B. São Paulo: Planeta de Agostini, 2003.

ABREU, Caio Fernando. O ovo apunhalado. Porto Alegre: L&M, 2001.

BARBIERI, Therezinha. Ficção impura. Prosa brasileira dos anos 70, 80 e 90. Rio de Janeiro: Eduerj, 2003.

BITTENCOURT, Gilda Neves da Silva. O conto sul rio-grandense: tradição e modernidade. Porto Alegre: UFRGS, 1999.

FISCHER, Ernst. A necessidade da arte. Trad. Leandro Konder. 9 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002.

FIGUEIREDO, Vera Lúcia Follain de. Escrever é cortar ou contar palavras?. (200-). Disponível em . Acesso em 07 de maio de 2006.

FONSECA, Rubem. Bufo & Spallanzani. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1985.

FONSECA, Rubem. O caso Morel. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

HOBSBAWM, Eric J. A era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. Trad. Marcos Santarrita. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

MORAES, Alexandre Jairo Marinho. Corpos ardentes e sujeitos violentados: O contemporâneo a partir dos textos de Rubem Fonseca e Caio Fernando Abreu. In: _______. Modernidades e pós-modernidades: literatura em dois tempos. Vitória: UFES, 2002.

PAZ, Octavio. A outra voz. Tradução de Wladir Dupont. São Paulo: Siciliano, 1993.

TOURAINE, Alain. Crítica da modernidade. 7. ed. Trad. Elia Ferreira Edel. Petrópolis: Vozes, 1994.

[1] Ernst Fischer, em A necessidade da arte, atribui a magia como a capacidade de mudar, transformar e recriar a natureza a fim de imitá-la e satisfazer as necessidades humanas na pré-história.
[2] Wofgang Iser (1996) chama de “jogo do texto” a imediata decodificação que fazemos ao ler um texto que nos remete a uma realidade em que está inserido.
[3] Os grifos são do crítico.